quinta-feira, 10 de julho de 2014

Copa do Mundo – Um ótimo editorial do Estadão e uma reportagem que repete uma mentira escandalosa do PT


O Estadão desta quarta publica um excelente editorial sobre a tentativa da presidente Dilma Rousseff de faturar com a realização da Copa do Mundo e até com a contusão de Neymar. Chama-se “Dilmar tropeça na bola”. Quem acompanha o que escrevo aqui sabe que não tenho como discordar do que vai lá. Reproduzo um trecho em azul: “Depois da partida de sexta-feira, em que o Brasil venceu a Colômbia e perdeu Neymar, a equipe da presidente Dilma Rousseff programou para daí a três dias um bate-papo entre ela e internautas sobre um único e óbvio assunto: a Copa. Tanto se tratava de uma jogada eleitoral que a primeira ideia foi usar a página que o PT administra na rede social em nome da candidata. Aí, abandonando-se ao cinismo, resolveram dar um tom “institucional” à marquetagem, transferindo a conversa para a página oficial da Presidência da República. (…)Esperta, Sua Excelência. Em dado momento do chat, para desdenhar das críticas, ela equiparou as previsões pessimistas em relação à Copa às que cercam, com mais razão ainda, o desempenho da economia este ano. A taxa do PIB em 12 meses mal supera 1%. Ninguém com a cabeça minimamente no lugar aposta numa metamorfose que redima os desastres da política econômica. Mas – e aí reside a esperteza dilmista – o resultado final do ano só será conhecido em começos de 2015. A essa altura, a presidente ou terá sido reeleita ou terá deixado o Planalto. Em qualquer hipótese, não haverá quem perca o seu tempo lhe cobrando o despropósito de agora.”

Admiravelmente bem escrito, como costumam ser os textos que se publicam na página 3 do jornal, ainda um reduto de cuidado com a Inculta & Bela.

Eis, no entanto, que, mais adiante, na página A6, topo com uma reportagem intitulada “Goleada em campo não vai influenciar eleição, diz Planalto”. Lá está Gilberto Carvalho, secretário-geral da Presidência, tentando pautar o debate e coisa e tal. Tratarei de sua tese — que poderia ser resumida assim: “o povo tem memória curta” — em outro post. Neste, quero chamar a atenção para um trecho (em vermelho) do texto, que vem com sete assinaturas:
“Embora o caos previsto pela oposição na organização da Copa não tenha ocorrido, o Planalto teme que o trauma da população com o fracasso do Brasil afete a autoestima dos brasileiros e provoque, sim, impacto eleitoral”.

Pois é…

O que vai acima em vermelho nunca aconteceu. A “oposição” — não sei quais são as pessoas designadas por essa palavra — jamais previu o insucesso da Copa do Brasil, muito menos “o caos”, que já é uma palavra carregada de carga política. Ou, então, os sete que assinam a reportagem, em companhia de quem a editou, exibam reportagens do próprio Estadão (só para começo de conversa) em que “a oposição” anuncie o… caos!

Isso é o que diz o PT sobre seus adversários. Fazer tal afirmação, como se dado da realidade fosse, assim como quem assegura que “hoje é quarta-feira”, corresponde a fazer campanha político-eleitoral. E NÃO ESTOU A DIZER QUE HAJA DOLO NISSO, NÃO! NÃO ESTOU A DIZER QUE OS JORNALISTAS FAZEM TAL AFIRMAÇÃO PORQUE ESTEJAM, DE MODO DELIBERADO, JOGANDO ÁGUA NO MOINHO DO PT. O EFEITO MAIS DELETÉRIO DA PATRULHA PETISTA É JUSTAMENTE ESTE: ESPALHAR A VERSÃO COMO SE FOSSE FATO, DE MODO QUE AQUELES QUE A REPETEM NEM SE DÃO CONTA DO QUE ESTÃO A FAZER.

A imprensa, sim; oposição, não!
Reportagens publicadas pela imprensa, estas sim, anteviram mais problemas do que de fato se estão verificando. E não havia dolo também nesse caso. Um de seus papéis é alertar para as dificuldades. É bem possível que muita coisa se tenha corrigido em razão de sua vigilância; é bem possível que muitos problemas tenham sido evitados em razão de suas advertências.

Quem é “a oposição”? Aécio? Serra? Alckmin? Aloysio? Campos? Marina? Preencham aí os nomes à vontade. Onde está a previsão de caos? Ora, ninguém é idiota a tal ponto. De resto, as críticas mais ácidas à realização da Copa do Mundo no Brasil surgiram de movimentos de rua, inicialmente em grupos de extrema esquerda, chegaram a ganhar o cidadão comum, que logo foi empurrado de volta para dentro de casa, constrangido por black blocs, com os quais Gilberto Carvalho dialoga. Ao governo federal, a violência dos mascarados sempre foi útil porque servia para espantar as pessoas de bem. Não estou afirmando, de forma oblíqua, que o Planalto esteja por trás dos black blocs. Estou afirmando de maneira clara, escancarada e inequívoca que o Planto dialogou com eles. E quem dialoga reconhece a legitimidade do outro. Fim de papo.

Mas já me desviei. Acho, como leitor apenas, inaceitável que a pauta de um partido — “a oposição previu o caos na Copa” — seja transmitida a leitores e internautas como se fosse informação séria, como se fosse fato. Não é.

O que oposicionistas fizeram, cumprindo a sua função, foi chamar a atenção dos brasileiros para as promessas que não foram cumpridas (obras de mobilidade), para as acusações de superfaturamento das obras, para o descumprimento de prazos — tudo, em suma, o que cabe, havendo motivos, a adversários do governo fazer numa democracia. Assim como a imprensa, também a oposição tem seu papel institucional.

Mas “caos” não! Reproduzir essa afirmação como se fosse informação corresponde a fazer campanha eleitoral petista. Se, antes, isso não era sabido, agora é.

PS — Ah, sim: quem escreve este texto é alguém que considera que a derrota do PT é fundamental para a sobrevivência da democracia no Brasil; que acha o governo incompetente; que sustenta que o PT é um partido autoritário; que nunca achou ou afirmou que a Copa seria um caos e que defende que lugar de black blocs é a cadeia, enquadrados na Lei de Segurança Nacional. Quem passa a mão na cabeça deles é Gilberto Carvalho, não eu. Mesmo assim, fui parar na “black list” do PT. Já os black blocs foram convidados para um cafezinho…

Por Reinaldo Azevedo

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