O que distingue a espécie humana é sua capacidade de confrontar o pensado com o conjunto dos conhecimentos disponíveis e regular o curso do pensamento pela escala de credibilidade que vai do possível ao verossímil, ao provável ou razoável e, em certos casos, à certeza.
No Brasil, raros opinadores têm o senso dessas distinções. A maioria imagina que para pensar com proveito basta um pouco de lógica formal e algum domínio dos chavões mais caros à platéia.
Em debate recente, o prof. Ígor Fúser, uma estrela do cast universitário esquerdista, assegurou que “não se pode julgar a maldade um regime pelo número das suas vítimas”. Dez minutos depois, desmentia-se fragorosamente ao alegar que a ditadura brasileira “perseguiu milhares de pessoas” e que o número de cristãos assassinados no mundo está muito abaixo dos cem mil por ano – subentendendo, portanto, que a ditadura foi um horror e que os matadores de cristãos nos países islâmicos e comunistas não são tão maus quanto se diz.
Mas o pior não é isso. Mesmo sem esses autodesmentidos grotescos, a afirmativa geral que os antecedeu – a mais comumente alegada por devotos comunistas empenhados em salvar a honra dos governos mais assassinos que o mundo já conheceu – é perfeitamente desprovida de sentido.
Para perceber isso basta medi-la com a escala de credibilidade.
Em política, admite-se universalmente, as certezas absolutas são raras ou inexistentes. O meramente possível reflete a liberdade da fantasia, o verossímil é apenas questão de opinião, gosto ou preferência. Não servem como argumentos. Resta a probabilidade razoável. Quem quer que argumente seriamente em política procura nos convencer de que a razão, com altíssima probabilidade, está do seu lado.
Acontece, para a tristeza dos tagarelas, que todo argumento de probabilidade depende eminentemente do elemento quantitativo que o fundamenta explícita ou implicitamente. Se digo que o candidato X vai vencer as próximas eleições com uma probabilidade de zero a cem por cento, não disse absolutamente nada. Tanto vale dizer que um governo é igualmente malvado se não matou ninguém ou se matou milhões de pessoas.
Quando um comunista esperneia contra o que chama de “contabilidade macabra”, tem, é claro, uma boa razão para fazê-lo. Contados os cadáveres, é impossível negar que o comunismo foi o flagelo mais mortífero que já se abateu sobre a humanidade. Diante disso, só resta apegar-se ao subterfúgio insano de que o macabro não reside em fazer cadáveres e sim em contá-los.
Somando à insanidade o fingimento, a proibição de contar tem de ser suspensa quando se fala de regimes “de direita”, donde se conclui que os quatrocentos terroristas mortos no regime militar – a maioria deles de armas na mão – são um placar muito mais hediondo e revoltante do que os cem milhões de civis desarmados que os heróis do comunismo assassinaram na URSS, na China, na Hungria, em Cuba etc.
O senso das quantidades e proporções é a exigência mais básica e incontornável não só da conduta honesta, mas da racionalidade em geral. Dissolvendo-o pouco a pouco na platéia, os fúseres da vida destróem não só a moralidade pública, mas as próprias condições elementares do funcionamento normal da inteligência humana.
Se nas universidades brasileiras há uma quota de quarenta a cinqüenta por cento de alunos analfabetos funcionais, isso não se deve só a uma genérica “má qualidade do ensino”, mas ao fato de que há décadas o discurso comunista e pró-comunista onipresente espalha, nas mentes dos estudantes, doses maciças de estimulação contraditória e obstáculos cognitivos estupefacientes.
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