sábado, 22 de novembro de 2014

Juiz dá recado a advogado que falou que propina é comum





Advogado de Fernando Baiano disse que no Brasil não se põe “um paralelepípedo no chão” sem propina; para juiz responsável pela Lava Jato, dizer "todos nós roubamos" é inaceitável



Em decisão que prorrogou a prisão do lobista Fernando Soares, conhecido como Fernando Baiano, o juiz federal Sérgio Moro, responsável pela Operação Lava Jato, fez uma crítica indireta ao advogado Mario de Oliveira Filho, que defende Baiano. Na quarta-feira, Oliveira Filho ficou nacionalmente conhecido ao dizer que não se faz obra pública no Brasil sem pagamento de propina.

“O fechar de olhos, com a aceitação do quadro criminoso, como se o crime fosse algo natural e inevitável, não constitui uma escolha aceitável. O álibi 'todos nós roubamos', lembrando o mesmo empregado no contexto da Operação Mãos Limpas italiana pelo então 'criminoso zero', Mário Chiesa ('tutti rubiano cosi'), não é jurídica ou moralmente aceitável e, ademais, sequer é verdadeiro”, argumentou o magistrado. “Por mais que prática criminosa da espécie tenha se espalhado pela falta de resposta institucional adequada, é evidente que não abrange a todos, quer agentes públicos, empresas ou demais indivíduos, e não representa o que pensa a sociedade brasileira”, continuou o texto.

Na quarta, o advogado disse que o pagamento de propina faz parte da “cultura” do País. “O empresário, porventura, faz uma composição ilícita com algum político e paga alguma coisa. Se ele não fizer isso, e quem desconhece isso desconhece a história do País, não tem obra. Pode pegar uma prefeitura do interior, uma empreiteirinha com quatro funcionários. Se ele não fizer acerto, ele não põe um paralelepípedo no chão”, disse Oliveira Filho na ocasião.

Prisão prorrogada
A decisão de Moro determinou que a prisão temporária (cinco dias) de Baiano fosse transformada em prisão preventiva (30 dias). Segundo depoimentos do doleiro Alberto Youssef e do ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa, Baiano seria operador do esquema de corrupção na estatal, cobrando propina para o PMDB – o partido e o lobista negam as acusações.
Ao justificar a prorrogação da prisão, Moro afirmou que “grande parte do esquema criminoso permanece ainda encoberto, sem que se tenha certeza de que todos os responsáveis serão identificados e todo o dinheiro desviado recuperado”. O magistrado, contudo, pondera que “aqui não se faz crítica partidária, pois se desconhece ainda o alcance e a duração da prática criminosa”.

Na decisão, o juiz ainda lembrou o "bloqueio de valores milionários" em contas de empresas administradas por Baiano – Hawk Eyes Administração de Bens, R$ 6,5 milhões; e Technis, R$ 2 milhões –, o que indicaria “que tais contas eram utilizadas para recebimento de valores, possivelmente indevidos”. “Evidentemente, caso esses valores tenham procedência lícita, em consultorias de serviços reais e lícitos, terá o investigado condições de, com facilidade, demonstrar documentalmente o fato a este Juízo”, completou Moro.

segunda-feira, 3 de novembro de 2014

Mensalão: Polícia Federal abre inquérito contra Lula





Ex-presidente agora é investigado como suspeito de intermediar repasse de 7 milhões de reais da Portugal Telecom ao PT; acusação partiu de Marcos Valério






A Polícia Federal confirmou, nesta sexta-feira, ter aberto inquérito para investigar a atuação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em uma das operações financeiras do mensalão. Agora, Lula é oficialmente investigado por sua participação no esquema que movimentou milhões de reais para pagar despesas de campanha e comprar o apoio político de parlamentares durante o primeiro mandato do petista.

O presidente teria intermediado a obtenção de um repasse de 7 milhões de reais de uma fornecedora da Portugal Telecom para o PT, por meio de publicitários ligados ao partido. Os recursos teriam sido usados para quitar dívidas eleitorais dos petistas. De acordo com Marcos Valério, operador do mensalão, Lula intercedeu pessoalmente junto a Miguel Horta, presidente da companhia portuguesa, para pedir os recursos. As informações eram desconhecidas até o ano passado, quando Valério - já condenado - resolveu contar parte do que havia omitido até então.

A transação investigada pelo inquérito estaria ligada a uma viagem feita por Valério a Portugal em 2005. O episódio foi usado, no julgamento do mensalão, como uma prova da influência do publicitário em negociações financeiras envolvendo o PT.

O pedido de abertura de inquérito havia sido feito pela Procuradoria da República no Distrito Federal. As novas acusações surgiram em depoimentos de Marcos Valério, o operador do mensalão, à Procuradoria-Geral da República. Como Lula e os outros acusados pelo publicitário não têm foro privilegiado, o caso foi encaminhado à representação do Ministério Público Federal em Brasília. Ao todo, a PGR enviou seis procedimentos preliminares aos procuradores do Distrito Federal. Um deles resultou no inquérito aberto pela PF. Outro, por se tratar de caixa dois, foi enviado à Procuradoria Eleitoral. Os outros quatro ainda estão em análise e podem ser transformados em outros inquéritos.

Segredos – Com a certeza de que iria para a cadeia, Marcos Valério começou a contar os segredos do mensalão em meados de setembro, como revelou VEJA. Em troca de seu silêncio, Valério disse que recebeu garantias do PT de que sua punição seria amena. Já sabendo que isso não se confirmaria no Supremo – que o condenou a mais de 40 anos por formação de quadrilha, corrupção ativa, peculato e lavagem de dinheiro – e, afirmando temer por sua vida, ele declarou a interlocutores que Lula "comandava tudo" e era "o chefe" do esquema.

Pouco depois, o operador financeiro do mensalão enviou, por meio de seus advogados, um fax ao STF declarando que estava disposto a contar tudo o que sabe. No início de novembro, nova reportagem de VEJA mostrou que o empresário depôs à PGR na tentativa de obter um acordo de delação premiada – um instrumento pelo qual o envolvido em um crime presta informações sobre ele, em troca de benefícios.