Formou-se no Congresso uma sólida maioria a favor da derrubada do decreto editado por Dilma Rousseff para obrigar todos os órgãos federais a incluir conselhos populares nos seus organogramas. Inaugurada pela oposição, a resistência ao decreto presidencial ganhou a adesão de partidos governistas. Entre eles o PMDB. Se o Planalto não recuar, a novidade será enterrada pelo Legislativo.
Nesta terça-feira, uma obstrução promovida por quatro partidos oposicionistas (DEM, PSDB, PPS e SDD) e um governista (PSD) paralisou o plenário da Câmara, derrubando a sessão. Autor de um projeto que revoga o decreto de Dilma, o deputado pernambucano Mendonça Filho, líder do DEM, foi ao microfone para anunciar o bloqueio.
“A partir de agora, estamos em obstrução total em defesa da autonomia do Poder Legislativo e para fazer com que o Palácio do Planalto nos escute”, disse Mendonça. “Não aceitamos esse decreto arbitrário, ditatorial, que passa por cima do Parlamento brasileiro. […] Ou o presidente da Câmara e a Casa se pronunciam e aceitam votar esse decreto, ou não teremos outras votações.”
Presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN) fez um apelo para que os patrocinadores da obstrução desistissem da manobra, prevista no regimento. Relatou aos colegas algo que já havia sido noticiado aqui no blog, no último final de semana. Em telefonema ao ministro Aloizio Mercadante (Casa Civil), Henrique sugerira que o Planalto substituísse o decreto de Dilma por um projeto de lei. Sob pena de sofrer uma derrota vexatória no plenário da Câmara.
“Se até esta quarta-feira o governo não tiver retirado o decreto, eu vou, sim, colocar em pauta. Vamos votar, com o apoio do PMDB, para derrubar o decreto”, disse Henrique Alves em plenário. “Antes de radicalizar, estou fazendo uma negociação republicana, para que o decreto seja revogado.” Os oposicionistas não se sensibilizaram. Henrique insistiu. Disse que a derrubada da sessão seria interpretada como manobra para fugir do trabalho por causa da Copa.
“A Câmara não trabalha só quando vota”, deu de ombros o líder do DEM. “Trabalha também quando se posiciona politicamente, deixando claro que houve uma invasão do nosso espaço institucional.” Mendonça recordou que a obstrução havia sido anunciada pela oposição desde a semana passada. “Não foi surpresa para ninguém.”
“O que deixa esta Casa desmoralizada são atitudes como essa da presidente Dilma”, ecoou Nilson Leitão (MT), vice-líder do PSDB. O coro foi engrossado pelo líder do PPS, Rubens Bueno (PR). A exemplo de Henrique Alves, Eduardo Cunha (RJ), do PMDB, rogou aos pares que levantassem a obstrução. Antecipou que os deputados peemedebistas ajudariam a derrubar o decreto se Dilma não o revogar. Mas a oposição fincou o pé.
A sessão foi à breca no instante em que os deputados se preparavam para votar um projeto que regulamenta o direito de resposta nos meios de comunicação. A proposta foi à pauta em reação a uma reportagem exibida no programa Fantástico, na noite de domingo. Nela, os congressistas foram acusados, genericamente, de desviar parte do dinheiro das emendas orçamentárias para o caixa dois de suas campanhas.
Abespinhado com a interrupção dos trabalhos, Henrique Alves decidiu suspender também a sessão deliberativa desta quarta-feira. Como haverá jogo da seleção brasileira na quinta, a Câmara não votará mais nada nesta semana. É improvável que volte ao trabalho na semana que vem. Talvez nem na seguinte.
Do outro lado do prédio do Congresso, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL) também foi ao microfone para informar que conversara com Dilma sobre o decreto dos conselhos populares. Renan fez pose de valente diante dos senadores. “Quem representa o povo é o Congresso. Por isso, o ideal, como falei para a presidente da República, é que a proposta seja enviada através de um projeto de lei ou mesmo através de uma medida provisória, para que seja aprimorada aqui.”
A exemplo do que sucedeu na Câmara, a oposição apresentou no Senado umaproposta de revogação do decreto de Dilma. Autor da proposição, Alvaro dias, vice-líder do PSDB, cobrou de Renan a votação. “Essa cópia de modelo cubano ou de modelo venezuelano não aprimora o regime democrático.”, disse senador tucano. “Ao contrário, a iniciativa representa um flagrante retrocesso. E a ação que devemos tomar é a imediata aprovação do projeto de decreto legislativo para sustar os efeitos do decreto presidencial.”
Outros senadores cobraram providências efetivas contra o decreto de Dilma. Entre eles, Pedro Taques (MT), do governista PDT. “Decreto presidencial não é lei. Decreto serve para detalhar, esclarecer, estabelecer o que está na lei. Esse decreto chega às raias da inconstitucionalidade desvairada, chapada, evidente”, disse Taques.
A despeito dos apelos, Renan não levou a voto a proposta que revogaria o decreto. Tão cedo não fará isso, já que anunciara, desde a semana passada, que o Senado não vai suar o paletó durante a Copa. Os senadores só retornarão ao trabalho em julho. Assim, ficou entendido que o decreto de Dilma, se não for revogado espontaneamente, será fulminado na Câmara e no Senado. Quando? Nem Deus nem o Felipão sabem.
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